Universidade precisa de outros 13 profissionais no quadro para atender à demanda de estudantes

Desde setembro do ano passado, uma decisão judicial provisória determinou que a Universidade Federal de Alagoas (Ufal), contratasse emergencialmente profissionais capacitados para exercer a função de tradutor e intérprete de Língua Brasileira de Sinais (Libras), a fim de apoiar alunos e professores surdos em sala de aula. Quase 10 meses se passaram e nenhuma contratação foi feita. 

O processo contra a Ufal foi uma determinação da Justiça Federal, após uma Ação Civil Pública movida pela Defensoria Pública da União, em Maceió. A denúncia é que os quatro campi da Universidade têm apenas 12 intérpretes, quando seriam necessários 25. À época, a Universidade se posicionou citando o cenário de corte de recursos: “Estamos sofrendo com o corte de recursos e com o contingenciamento do repasse”. 

De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase *68% da população com deficiência não tem instrução ou possui apenas o  ensino fundamental incompleto. Situação preocupante, uma vez que a política de acessibilidade proposta pela Lei de Inclusão da Pessoa com Deficiência (PcD) no Brasil, Lei n. 13.146, garante o direito à educação.  Na prática, muitas escolas e universidades ainda estão atrasadas nesse sentido. Sem acessibilidade, o grupo encontra mais dificuldades para acessar o conhecimento e ter mais oportunidades de trabalho, por exemplo.

Lígia Ferreira, professora da Ufal (Foto: Ascom Ufal)

Segundo informações da professora associada e coordenadora do Curso de Letras – Libras da Faculdade de Letras (FALE), Lígia Ferreira, há cerca de 40 pessoas com deficiência auditiva na instituição, entre estudantes e professores, que enfrentam esses problemas.

“Alunos/as e professores/as surdos/as ficam sem o acesso às aulas, pesquisas, extensão, orientação, gestão administrativa, enfim, sem o acesso garantido por lei às pessoas surdas de comunicação e permanência nos cursos. Estamos enfrentando problemas sérios com essa inacessibilidade, porque temos 4/5 professores/as surdos/as na UFAL, nos três campi (A. C. Simões, Arapiraca, Sertão), e desenvolvem suas aulas sem TILSP (Tradutor e Intérprete de Libras/LP), com dificuldades comunicacionais de toda ordem”, contou à reportagem do Olhos Jornalismo.

Para a educadora, essa situação é agravada pelas leis direcionadas à acessibilidade  terem sido criadas tardiamente, o que dificulta a provisão de recursos, a ausência de planejamento, estatísticas e projeções para que a área seja seja implantada e fiscalizada.

“Pela marginalidade imposta à Libras em nosso país, o acesso ao ensino superior enfrenta as mesmas dificuldades que as pessoas surdas enfrentam ao longo da vida escolar: ausência de professores/as que saibam se comunicar em Libras com elas; TILSP que assumem o papel de professores/as porque muitas vezes aquele/a que deveria propiciar o processo de ensino-aprendizagem se exime da responsabilidade dizendo não conhecer a língua de sinais, o que dificulta a aproximação professor/a-aluno/a; a negação da família em estimular as crianças e adolescentes surdos/as em aprender a Libras, o que causa enormes barreiras comunicativas a essas pessoas, pois não são usuárias da Libras, sua língua natural, nem da Língua Portuguesa, que surge como segunda língua. Nisso tudo, o papel do/a TILSP é fundamental. Se há uma lei de acesso ao ensino superior para pessoas com deficiência, as instituições devem estar preparadas/estruturadas para esse público. Isso é lógico”, ressaltou a coordenadora. 

Impasse

Em abril deste ano, a gestão da Universidade, atendendo a uma  solicitação da professora Lígia, se reuniu para debater sobre o déficit de profissionais capacitados no quadro da instituição. Apesar do encontro, nada foi feito. 

De acordo com o pró-reitor de Gestão de Pessoas e do Trabalho, Wellington Pereira, a situação é afetada, em suma, pelo próprio Plano de Carreira dos Cargos Técnico-Administrativos em Educação, pois o cargo de Tradutor e Intérprete de Libras de Nível Superior encontra-se vedado desde o Decreto nº 10.185 de 20 de dezembro de 2019.

Atualmente, há a previsão de contratação temporária de caráter excepcional, por meio da contratação de serviços de execução indireta (terceirização). O Ministério da Economia, em relação às demandas para contratação de pessoal para atendimento a pessoas com deficiência matriculadas nas instituições federais de ensino, tem orientado que essa seja realizada preferencialmente dessa forma

Do ano passado para cá, algumas articulações foram feitas na tentativa de contratar profissionais temporários. Em outubro do ano passado, a Pró-reitoria de Gestão de Pessoas e do Trabalho (Progep) abriu um edital simplificado para contratação, por tempo determinado, de Tradutor e Intérprete de Libras e o processo já estava concluído, com aprovação de 11 candidatos. Porém, foi interrompido quando o Ministério da Educação (MEC)  conseguiu suspender a decisão judicial. 

“Todas as medidas cabíveis, por parte desta UFAL, foram adotadas. Estamos aguardando o desfecho da Ação Civil Pública para retomarmos as contratações por força de ordem judicial”, finalizou Wellington. 

Improvisando para tentar aprender

Enquanto os processos ‘correm’ na justiça, os docentes e os próprios alunos procuram formas de auxiliar os professores e estudantes surdos em sala de aula, adotando decisões práticas que busquem integrá-los nas dinâmicas que ocorrem.  

“Em nossas aulas, costumamos dispor as cadeiras em “U” (em semicírculo); espaços de convivência; adoção de equipamentos para projeção de imagens, vídeos, nas aulas; iluminação adequada para essa projeção. Os professores/as, técnicos/as e coordenadores/as dos cursos têm criado alternativas para a melhor adequação desses/as estudantes ao processo de ensino-aprendizagem. Apesar dos nossos semestres contarem com prazos muito curtos para essas adequações, todos/as têm tentado minimizar os efeitos prejudiciais dessas barreiras comunicacionais promovidas pela ausência de TILSP nas Universidades brasileiras, em especial, na UFAL. Em suma, essa ausência de profissionais em diversas áreas que prejudicam o processo educacional precisa contar com o apoio e luta coletivos”, informou a coordenadora do Curso de Letras-Libras, Lígia Ferreira. 

*Os dados fazem parte da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019, divulgada no dia 28 de agosto de 2021.*

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