Escritor paulistano faz série de poemas sobre a quarentena
Da Redação
O poeta paulistano Lucas Lins escreveu uma série de poemas sobre o período de quarentena na Cidade Tiradentes, Zona Leste de São Paulo. O projeto intitulado Poesia Pra Matar o Corona já atingiu a marca de 21 dias consecutivos. Ele atua como Jovem Monitor Cultural na Casa de Cultura Hip Hop Leste em Cidade Tiradentes, e desde que foi decretado no dia 16 de Março, pelo governador do estado João Dória — o isolamento social na capital paulista — começou a desenvolver a ideia de criar poemas com a intenção de superar um desafio pessoal que transitava entre a procrastinação e o bloqueio criativo.
Conforme avança na leitura da série, nota-se a presença de diversos temas relacionados ao cotidiano, como a violência do bairro mesmo em tempo de pandemia, “panelas em santa cecília/ janelas da barra funda/ mãos lavadas com álcool/ máscara na cara/ na quebrada Balas Balas Balas”. Bem como a aglomeração inevitável na periferia: “casa lotérica hipermercado extra/pessoaspessoaspessoaspessoaspessoas”, e o aumento de trabalhos informais neste período: “o primeiro que apareceu na calçada foi um vendedor ambulante/ tem mercadoria nova essa semana/ máscara contra o coronavírus”.
Mas também há poesias sobre a saudade, a limpeza da casa, o seu aniversário, entre outros. De Clarice Lispector ao Mc Neguinho do Kaxeta, tudo é inspiração para Lins. O Poeta segue firme em seu exercício diário, e pretende continuar neste ritmo até o controle da pandemia no estado. E aguarda ansiosamente pelo fim da quarentena, do retorno da rotina dos trabalhadores e dos estudantes. Você pode conferir uma poesia por dia na página do autor.
O poeta da quebrada
O escritor é oriundo da Cidade Tiradentes, zona leste de São Paulo, um bairro com mais de 200 mil habitantes, considerado o maior conjunto habitacional da América Latina. O autor transforma essas esquinas em poesia, como é o caso de “MC Donald’s na Quebrada”, texto que escreveu a partir da abertura do primeiro quiosque da franquia no bairro, fato que causou tamanho alvoroço, trazendo destaque internacional através do jornal espanhol El País. “É apenas quiosque de casca e massa/ nem vende lanche com pão/ mas crianças do pedra branca até cabulam aula/ abriu um Mc Donald’s na Quebrada”, ressalta.
Segue abaixo três poemas de Lucas Lins
Poesia pra Matar o Corona #7
não vai ter bolo
surpresa
abraço
presente
apenas
parabéns
assim distante
assim virtual
assim frio
como recomendam as orientações de segurança.
Poesia pra Matar o Corona #16
casa lotérica
hipermercado extra
pessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoaspessoas
poluição
polui trânsito
BUZINA
vacina
pixo
panela
globo
lixo
impeachment
china
itália
trump
frança
londres
tosse
espirro
medo
morte
e
co
no
mia
Poesia pra Matar o Corona #21
aquele texto da Clarice é o seu favorito
-Por não estarem distraídos-
sua voz empolgava
criava teses
teorias
acadêmicas e artísticas
do quanto era importante
visceral
fulminante que todos lessem aquele texto
a vida seria mais azul
lilás
ou das setenta e duas cores da caixinha faber castell
tamanha importância histórica
universal
capaz de fazer o fmi repartir o pão
e o presidente do Brasil calar a boca
o estado de são paulo lidera a contagem de mortos
e a quantidade de suspeitos
já li dois livros em quinze dias
escrevo para poupar os ouvidos
e o que os espelhos dizem sobre mim
quando a mente divaga é criativa
entendi a razão da sua empolgação
Sobre o escritor:
Reside na Cidade de Tiradentes, periferia da zona leste de São Paulo, e começou a escrever a partir do 2°ano do ensino médio quando conheceu o movimento de saraus na escola pública. O jovem é autor de duas publicações independentes, “Remando Contra a Maré” (2016) e “Declínio & Esplendor da Bicicleta” (2018). Concluiu recentemente o curso de criação literária do autor Marcelino Freire, Além disso, o poeta foi Residente Literário da FLIM – Festa Literomusical do Parque Vicentina Aranha, que aconteceu em São José dos Campos, em 2019, onde realizou a abertura da mesa do autor moçambicano Mia Couto.