Maceió amanheceu com várias ruas alagadas nesta quarta-feira (5), após um volume de chuva que ultrapassou o esperado para todo o mês de fevereiro em apenas 24 horas, segundo a Defesa Civil Municipal. Ruas intransitáveis, trânsito caótico e famílias desalojadas escancaram um problema que vai além da intensidade de um fenômeno natural e esperado.
Especialistas ouvidos pela reportagem do Olhos Jornalismo alertam que a impermeabilização do solo e a ausência de um sistema eficiente de escoamento tornam a capital alagoana cada vez mais vulnerável a alagamentos.
Adotando uma estratégia de desinformação e superficialidade sobre o problema, o prefeito de Maceió, JHC (PL), publicou em seu perfil do Instagram fotos de bueiros entupidos, afirmando que a prefeitura realiza limpezas periódicas, mas que a quantidade de lixo nas ruas – jogado pela população – estaria prejudicando a eficácia dessas ações – o que é refutado por estudiosos na área de planejamento urbano e asfalto.
Nos últimos anos, diversas ruas e avenidas da capital – antes pavimentadas com paralelepípedos – foram asfaltadas sem a implantação de um sistema de drenagem subterrânea compatível. O asfalto impermeável impede a infiltração da água no solo, acelerando o escoamento e sobrecarregando os sistemas de drenagem existentes.
Para a engenheira civil pela Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) e mestre em Geotecnia pela mesma instituição, Priscila Maciel, a substituição sem o devido planejamento pode gerar impactos estruturais e ambientais.
“Quando há a troca da pavimentação permeável por uma impermeável, perde-se o processo natural de infiltração da água no solo. Isso aumenta a velocidade do escoamento, sobrecarrega o sistema de drenagem e gera danos em estruturas que não foram projetadas para suportar esse volume de água”, ressalta a profissional.
O arquiteto e urbanista e mestre em meio ambiente pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), Dilson Ferreira, acrescenta que a topografia da cidade agrava o problema e que, por isso, as gestões devem ficar atentas as quaisquer mudanças que queiram promover na cidade.
“Maceió tem variações de altura significativas. Com a impermeabilização do solo, a água corre mais rápida sobre o asfalto, transformando ruas em verdadeiros rios nos dias de chuva”, comenta o também professor universitário.
Ferreira destaca, ainda, que bairros como Santa Amélia, Santa Lúcia e a região do Village Campestre, na Cidade Universitária, além das diversas grotas asfaltadas, possuem apenas um sistema de condução superficial, incapaz de dar vazão ao volume de chuva durante tempestades.
“Culpabilizar a população pelo lixo nas ruas não resolve a questão. É preciso investir real em drenagem urbana, ampliação de áreas permeáveis e preservação dos espaços que ajudam a absorver a água da chuva”, ressalta o arquiteto.
Imagens mostram estragos causados na região da Levada, parte baixa de Maceió (Fotos: @Zazo/Olhos Jornalismo)
O Plano Diretor existe, mas nunca saiu do papel
O problema dos alagamentos em Maceió não é novo. A cidade conta com um Plano Municipal de Saneamento Básico (Lei nº 6.755/2018), que prevê melhorias na drenagem urbana, esgotamento sanitário, limpeza urbana e abastecimento de água. No entanto, o plano nunca foi implementado.
Para os especialistas ouvidos pela reportagem, a gestão de JHC aposta em medidas paliativas, como limpeza emergencial de bueiros e campanhas de conscientização sobre o descarte de lixo, sem resolver a raiz do problema.
Não tão distante da capital alagoana, Recife e Fortaleza já utilizam asfaltos drenantes, o que permite maior absorção de água e redução dos impactos das chuvas. Em Maceió, no entanto, esse tipo de pavimentação ainda não foi adotado.
Os especialistas defendem que a cidade precisa de um modelo de urbanização mais sustentável, que inclua:
Sem essas mudanças estruturais, os alagamentos irão continuar fazendo parte da rotina dos maceioenses nos dias de chuva.
Ocorrências e orientações à população
Até o momento, a Defesa Civil de Maceió recebeu 45 ocorrências, sendo: 11 por desabamento parcial de residências; o bairro mais atingido foi o Jacintinho com 11 ocorrências. Pelo menos três pessoas estão desabrigadas e foram encaminhadas para abrigo municipal; outras 27 estão desalojadas, mas foram abrigadas em casas de parentes.
Em caso de urgência, a população deve acionar a Defesa Civil ligando para 199. A ligação é gratuita.
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Muito fácil culpar o povo e se isentar da responsabilidade.