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Por que é importante divulgar o fator cor/raça nos boletins epidemiológicos de AL?

Após ação do Ineg, Secretarias passaram a informar dados sobre a população negra na pandemia

Texto: Jean Albuquerque

Arte em destaque: A Coisa Ficou Preta

Nos anos 90, o grupo de Rap paulistano que escreve seu nome na história da música brasileira desde 1988, Racionais Mc´s, já alertava para os dados negativos que envolvem a população preta no país em Capítulo 4 Versículo 3*, uma canção do disco Sobrevivendo no Inferno (1997).

“60% dos jovens de periferia / Sem antecedentes criminais / Já sofreram violência policial / A cada quatro pessoas mortas pela polícia, três são negras / Nas universidades brasileiras / Apenas 2% dos alunos são negros / A cada quatro horas um jovem negro morre violentamente em São Paulo / Aqui quem fala é Primo Preto mais um sobrevivente […]”.

Quem sobreviveu aos anos 90, hoje tem outras dificuldades para superar. Diante da maior crise sanitária do mundo, a população negra tem sofrido com a Covid-19 no Brasil. Uma matéria publicada na Agência Pública dá conta de que a quantidade de morte de pacientes negros confirmada pelos dados do Governo Federal tem crescido no país. “[…] A explosão de casos de negros que são hospitalizados ou morrem por Covid-19 tem escancarado as desigualdades raciais no Brasil: entre negros, há uma morte a cada três hospitalizados por SRAG [Síndrome Respiratória Aguda Grave] causada pelo coronavírus; já entre brancos, há uma morte a cada 4,4 hospitalizações”, relata reportagem. Os dados divulgados são de até 26 de abril.

Na tentativa de obter os dados de Cor/Raça nos boletins epidemiológicos da Covid-19 no Estado de Alagoas, o Instituto Negro de Alagoas (INEG/AL) solicitou via Ministério Público (MP/AL) a inclusão das informações nos informativos da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau/AL) e Secretaria Municipal de Saúde (SMS).

Até então, mesmo com a portaria n° 344, de 1 de Fevereiro de 2017, do Ministério da Saúde, que diz que fica a cargo das secretarias de saúde a coleta do quesito cor e o preenchimento do campo denominado raça/cor nos formulários de saúde, a iniciativa não estava sendo feita.

À reportagem do O que os Olhos Não Veem, o militante do Movimento Hip Hop e integrante do INEG/AL, Geysson Santos, contou que ainda é necessário que as organizações da sociedade civil fiscalizem o cumprimento de medidas voltadas para as populações específicas. “Infelizmente, ainda não há uma preocupação do Estado para a garantia de condições básicas de subsistência da população negra. Em todo o Brasil, as secretarias só passaram a calcular racialmente os impactos deste vírus após provocação de instituições do movimento negro. Aqui em Alagoas não foi diferente”, relata.

Dias após o pedido, a Secretaria de Estado da Saúde passou a fornecer os dados a partir desse recorte. Já a Prefeitura de Maceió demorou a atender a recomendação e só a partir dessa segunda-feira (11) os dados passaram a ser disponibilizados.

De acordo com Santos, a justificativa do titular da pasta municipal, José Thomaz Nonô (DEM/AL) foi a de que não havia “pessoal ocioso” para realizar o levantamento dos dados.

“Além de ser uma justificava desrespeitosa, na nossa concepção é um argumento racista por reforçar que levantamento de estatísticas para a parcela da população mais precarizada e que historicamente teve seus acessos negados deve ser feito apenas se houver “funcionários desocupados”. Porém, após essa declaração a Promotoria solicitou mais uma vez que fosse cumprida a recomendação”

O integrante do Instituto acredita que se não houvesse a ação do INEG/AL – junto ao MP – o Governo do Estado e a Prefeitura de Maceió dificilmente revelariam as informações referentes ao fator cor/raça nos boletins oficiais. “Provocamos o MP com aproximadamente dois meses pós-quarentena, se durante esse tempo o Estado não foi proativo em relação a coleta desses dados, fica difícil acreditar que tomariam essa iniciativa.”, defende.

Geysson Santos destaca ainda a importância do recorte de cor/raça nos boletins epidemiológicos da Covid-19.

“A relação de raça e classe no Brasil são interligadas. É necessário que possamos ter um recorte específico do que representa os impactos da COVID-19 na população negra, para além de reafirmar o que nos é negado historicamente, mas também para garantirmos subsídios que legitimem e contribuam no seio do debate de políticas públicas. A pandemia escancara o que há de pior no país: a desigualdade social. É preciso que possamos extrair, nesse momento, novos números para aprimorar políticas públicas para a população negra. É urgência e deve ser uma tarefa prioritária do Estado”.

De acordo com o professor universitário e mestre em Educação pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Cláudio Jorge, a divulgação dos dados é imprescindível para que ações que propiciem a melhoria das condições de vida nas periferias espalhadas brasil afora possam ser pensadas e executadas.

“Acho que a principal questão é a escancarada omissão histórica das políticas públicas que assumiu um caráter negacionista no Governo Federal. A população negra que sempre foi radicalmente esquecida no projeto de nação e o processo de invisibilidade aprofunda o racismo à brasileira no país. Epidemiologicamente, ela será a mais afetada e não será possível um mapeamento desse recorte pelo procedimento racista que impregnou a nossa formação social”, argumenta.

Parda x Preta

Os dados sobre a Covid-19 em Alagoas com o fator cor/raça, divulgados pelo Centro de Informações Estratégicas e Resposta em Vigilância em Saúde CIEVS/AL, informe epidemiológico nº 67, até ontem (12), dão conta de que dos casos confirmados 48% foram identificadas como pardas, 1% preta, 43% não informaram e apenas 8% da cor branca. Já em relação aos óbitos: 43% parda, 2% preta, 44% não informado e 11% branca.

No tocante aos mesmos dados de Maceió, mediante Informe Epidemiológico COVID-19, Nº 52/2020 divulgado pela Secretaria de Saúde de Maceió (SMS), os casos somam 29.1% da cor parda, 4.76% preta e 8.99% branca, com o número de 55.56% de raça em análise. Já os óbitos correspondem a 12.94% parda, 1.18% preta e 1.18% branca, com 84.71% da raça/cor em análise.

Em comparação aos pacientes diagnosticados e mortes de pessoas da cor branca – ao somar o número de casos confirmados e de óbitos da população de cor preta com a identificada como parda – os números são significativos e superiores.

O que dizem as assessorias

Questionada pela reportagem a respeito da importância de identificar o fator cor/raça nos infectados pelo novo coronavírus e a possibilidade de a partir dos dados pensar em políticas estratégicas de prevenção para esse grupo social, a assessoria de comunicação da Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau/AL) enviou por e-mail a seguinte nota:

“A Secretaria de Estado da Saúde de Alagoas (Sesau/AL) esclarece que os dados sobre cor/raça já estão incluídos no Boletim Epidemiológico da Covid-19. Salienta que não faz distinção da assistência prestada aos usuários atendidos, independente de cor, raça e sexo.”

Já a assessoria da Secretaria Municipal de Saúde de Maceió (SMS) informou apenas que o boletim com os casos de coronavírus em Maceió contam com dados de raça e cor a partir de ontem (12).

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Géssika Costa

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