Com um das festas mais caras o país, capital alagoana é contestada por falta de transparência dos recursos públicos e por dever cachês a artistas locais

Por Marcel Leite, da Mídia Caeté

Não é segredo para ninguém que a gestão do prefeito João Henrique Caldas (PL) gosta de chamar a atenção, seja pelas obras megalomaníacas ou pelos megaeventos, que trazem, em grande parte, artistas caros e de renome nacional. Mais uma vez, esse costume se manteve, agora com o São João Massayó 2024.

Na edição deste ano, a prefeitura mantém o padrão de ostentação para bater de frente com as festas juninas mais tradicionais do país: o São João de Caruaru (PE) e o de Campina Grande (PB). Somados os cachês de todos os shows, Maceió vai desembolsar mais de R$15 milhões. Para termos uma ideia, de acordo com o Diário Oficial, somente o cantor Gusttavo Lima receberá R$1,2 milhão (o que equivale a R$10 mil por minuto); nos anos anteriores, o sertanejo recebeu R$800 mil e R$980 mil respectivamente.

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Mesmo com esse espetáculo de cifras “para a cultura”, a gestão municipal não vem cumprindo com a sua obrigação perante os artistas locais, os quais – muitas vezes – convivem com atrasos nos pagamentos dos seus cachês em eventos organizados pela Prefeitura. Isso tudo gera desconfiança e diversos questionamentos, sobretudo de quem faz arte na capital.

Para piorar ainda mais a percepção sobre a administração dos recursos por parte da de JHC, Maceió ocupa uma posição indigesta em um índice da Open Knowledge Brasil, recebendo a nota mínima quando se trata de transparência sobre políticas públicas. A linda e festiva Maceió é a 3ª pior capital do país no quesito.

Divulgado no início de junho, o “Índice de Dados Abertos para Cidades 2023” avaliou as 26 capitais brasileiras, organizando as classificações por setores da gestão pública.

A pontuação do estudo é obtida por meio de um somatório das notas de cada dimensão temática e da nota da dimensão de governança, dividindo-se o resultado pelo número total de dimensões (15) e, em seguida, multiplicando por 100. Quanto mais distante de 100 for a pontuação, menor será a qualidade e a disponibilidade de dados abertos naquele município. Maceió possui a pontuação de 1%.

As cidades poderiam responder através de um questionário, onde indicariam a existência de recursos mínimos para abertura de dados. Apenas 16 municípios deram retorno dessa forma, enquanto outros 8 responderam via Lei de Acesso à Informação (LAI). Maceió não retornou por nenhum meio.

Segundo a pesquisa, a Governança de Dados “busca construir uma visão estrutural sobre as políticas de dados abertos das capitais, mapeando instrumentos e recursos básicos adotados pelas prefeituras para abrir dados que visem ampliar a transparência de informações públicas de forma articulada à proteção de dados pessoais e sensíveis”.

Ao O Globo, a coordenadora de Advocacy e Pesquisa da Open Knowledge Brasil, Danielle Bello, disse que a visão geral apresentada pelo índice é crítica. Segundo ela, a maioria das capitais não publica nenhum conjunto de dados básicos em todas as áreas de políticas públicas avaliadas.

“É um contexto preocupante, que nos faz questionar: se a situação naquelas que estão entre as maiores cidades do país é esta, como é o cenário em outros municípios do Brasil?”, afirma Danielle.

ATRASO DOS PAGAMENTOS E AUSÊNCIA DE RESPOSTAS

Novamente, artistas maceioenses se viram de mãos atadas. Agora, perto de completar um mês de atraso, os pagamentos da Lei Paulo Gustavo continuam a gerar suspeitas e reclamações. Muitos artistas relatam passar por dificuldades, principalmente mestres e premiados, que aguardam receber valores considerados irrisórios.

Artistas locais relatam que a Lei Paulo Gustavo (LGP), inicialmente destinada a ser uma medida emergencial, tem se arrastado há mais de um ano na Secretaria Municipal de Cultura e Economia Criativa (Semce). Recentemente, os artistas se reuniram com o prefeito João Henrique Caldas, que prometeu resolver a situação.

“Desrespeitando todos os prazos estabelecidos por seus próprios editais, a Semce segue anunciando pagamentos que não têm acontecido. São inúmeras as reclamações da classe artística nas postagens da secretaria e nos grupos de WhatsApp. Não dá mais pra aguentar esse descaso. A indignação é grande, principalmente pela demora em resolver um problema que, segundo eles, poderia ser resolvido rapidamente com uma gestão eficiente”, afirma o Comitê Paulo Gustavo Alagoas.

Em postagem conjunta, o Fórum Cultural de Maceió, o Fórum de Teatro de Maceió e o Fórum da Música de Maceió reforçam a indignação pela falta de pagamento e, sobretudo, de explicações.

“Mais um São João e é a mesma história: cachês milionários pra quem é de fora e atrasos pra quem é de Maceió. Não somos contra os mega eventos, nem que artistas de renome nacional venham para nossa cidade. Mas isso precisa acontecer num contexto de valorização dos que estão aqui. Não adianta nada gastar 1,2 milhão de reais na contratação do Gusttavo Lima e estar devendo R$ 4 milhões da Lei Paulo Gustavo. Por que isso está acontecendo? Cadê o diálogo com a população e as explicações sobre atraso nos editais e cachês? Onde está a política pública da cultura? A população pede por respostas! E por valorização aos que são de Maceió!”, diz a publicação.

Os fóruns também lembram dos atrasos e da necessidade urgente de respostas: “Já se mais de 20 dias de atraso do pagamento da Lei Paulo Gustavo. Isso depois de outros tantos atrasos necessários com as retificações dos editais da LPG. O que recebemos da Semce é nenhuma resposta oficial. Apenas uma matéria dizendo que já pagou R$ 6 milhões aos artistas. Enquanto isso, nos fóruns os números de questionamentos e relatos de não recebimento se amontoam. As dúvidas não tem respostas. A única certeza é infelizmente o atraso”.

Os pagamentos da Lei Paulo Gustavo, conforme editais publicados pela própria prefeitura de Maceió, deveriam ter sido realizados, em prazo máximo, até o dia 31 de maio. Para se ter uma ideia, Maceió é a única capital brasileira que não executou a lei emergencial, ainda relativa à pandemia.

SUPLEMENTAÇÃO JUNINA” PARA A FMAC

No último dia 14 de junho, a Prefeitura de Maceió anunciou, no Diário Oficial, que iria encaminhar uma quantia de mais de R$ 30 milhões a diversos órgãos do município. Porém, o ponto que chamou a atenção não foi exatamente o valor, mas sim a divisão do repasse: a Fundação Municipal de Ação Cultural (FMAC) foi agraciada com mais R$ 25 milhões para “fomentar a cultura”.

Diário Oficial de Maceió, publicado no dia 14 de junho. | FOTO: Prefeitura de Maceió.

Como bem noticiou o jornalista Kléverson Levy em seu blog, a FMAC recebeu praticamente toda a suplementação que deveria ser disponibilizada também para outras pastas da cidade justamente no mês do São João Massayó 2024.

“Fica aberto no Orçamento da PREFEITURA MUNICIPAL DE MACEIÓ, em favor de DIVERSOS ÓRGÃOS, um crédito adicional suplementar no valor de R$ 30.148.197,00 (Trinta milhões, cento e quarenta e oito mil, cento e noventa e sete reais), para atender à programação constante do Anexo I deste Decreto”, diz a publicação.

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A Mídia Caeté entrou em contato com a Prefeitura de Maceió para um posicionamento sobre os questionamentos acima. Até a publicação desta reportagem, não tivemos retorno.

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