Apresentação do edital ocorre na semana de retorno da CPI do Senado Federal que investiga o crime ambiental em Maceió

A Braskem, empresa responsável pelo crime ambiental que afundou cinco bairros da capital alagoana e afetou diretamente a vida de 60 mil pessoas que tiveram de deixar suas casas, lançou esta semana a terceira edição do seu edital “social”. 

A ação foi apresentada paralela ao retorno dos trabalhos da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Braskem, que retornou nesta terça-feira (07), ao plenário do Senado Federal. Vale lembrar que, na agenda dos senadores, estão previstas amanhã (08), visitas às minas de sal-gema e à Central de Monitoramento, em Maceió, além de uma reunião com as procuradoras da República, responsáveis pelas ações relacionadas ao afundamento do solo.

No site oficial do edital, a petroquímica parece esquecer do problema que causou. Nele, a empresa alega que têm o propósito de melhorar a vida das pessoas, criando soluções sustentáveis e defende, ainda, que, atua em linha com os objetivos de desenvolvimento sustentável da ONU para 2030 e que assume novos compromissos com as pessoas e com o planeta.

“Um desses compromissos está ligado à responsabilidade social e aos direitos humanos, no qual queremos ser reconhecidos pela promoção aos direitos humanos e a equidade em nossa cadeia de valor e contribui para o desenvolvimento local das comunidades com a qual nos relacionamos”, diz o texto.

Printscreen do site oficial do edital da Braskem (Foto: Reprodução)

Moradores e membros da sociedade civil ouvidos pela reportagem do Olhos Jornalismo disseram que o lançamento do edital representa uma afronta a dor e ao trauma vivido pelas famílias e empreendedores dos bairros Pinheiro, Mutange, Bebedouro, Bom Parto e parte do Farol que tiveram de deixar seus imóveis para trás devido ao crime. 

Para a ativista, hacker e fundadora do Observatório do Caso Braskem, Evelyn Gomes, o que a bilionária do setor de plástico lançou pode ser definido como greenwashing – um termo em inglês que pode ser traduzido como “lavagem verde” e é praticado por indústrias públicas ou privadas, organizações não governamentais e até governos. Na prática, uma tática de marketing, para promover discursos, ações e propagandas sustentáveis que, ironicamente, só se sustentam na teoria. 

“É uma óbvia ação de greenwashing. Quando você pensa no nome ‘Projetos que transformam’ – que tem com o propósito de melhorar a vida das pessoas, a gente já cria um paradigma. Porque a gente está falando da empresa responsável e que se assumiu como responsável por tudo que aconteceu”, relembra a hacker, em alusão ao depoimento de Marcelo Arantes, vice-presidente Global de Pessoas, Comunicação, Marketing e Relações com a Imprensa da mineradora que admitiu, em 10 de abril, que a empresa era a culpada pelos problemas relacionados ao processo de instabilidade do solo.

Evelyn Gomes, do Observatório do Caso Braskem

Além dos contrastes, para a ativista, o valor do edital a ser distribuído entre as iniciativas contempladas – que pode chegar até R$50 mil – não é capaz de contribuir significativamente com nenhuma solução de maneira prática, tampouco representar todos os danos causados à cidade.

“Tem outros pontos bem problemáticos: um valor muito baixo, de R$50mil, que a gente sabe que é impossível pagar bons projetos. Esses projetos não vão ter capacidade de solução efetiva. Eles vão ter capacidade de uma solução criativa. Quando a gente vai olhar os ganhos de uma petroquímica, como essa, é um absurdo oferecer esse valor. É só mais uma ação de greenwashing, para tentar limpar o seu nome como uma solucionadora, sendo que, na verdade, ela é uma causadora do problema e não tem como ela seguir os objetivos da ONU, né? Sendo o que é: uma petroquímica que destrói cidades, que danifica o meio ambiente, que não tem segurança efetiva”, pontuou Gomes.

Uma das 60 mil vítimas da Braskem, Luciana Ciríaco, ex-moradora do bairro do Pinheiro, também chama a atenção para a construção da narrativa contraditória da empresa, a partir da apresentação do “Projetos que transformam”.

“É como se houvesse uma preocupação com desenvolvimento sustentável, com o meio ambiente, com problemas socioambientais, enquanto é tudo contraditório, porque ela nunca foi exemplo para questões de cuidados ambientais. São cinco bairros totalmente devastados. Hoje, várias famílias, como a minha, tiveram que deixar suas residências e receber uma indenização que não está de acordo, se contentar com aquilo, na verdade, se conformar”, ressalta a ex-moradora.

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